sexta-feira, 8 de julho de 2011

Felipe Neto posta texto sobre sua gravação com Fiuk: "Artistas Vendidos"


Felipe Neto
Aconteceu em 21 de julho de 2010, há 11 meses da data em que escrevo essa coluna. Na época, gravei um vídeo denominado “Não Faz Sentido – Fiukar”, onde critiquei atitudes de artistas em geral que se estabeleciam numa falsa posição de declarar amores aos seus fãs, tratar as adolescentes como suas namoradas e se fixar na superficialidade da consequência de um trabalho artístico reconhecido: os gritos dos fãs, que na minha concepção estão muito abaixo na lista de objetivos que devem ser traçados por um artista. Na época, destacava-se um indivíduo que praticava tais atos diariamente e acabou dando nome ao verbo que utilizei: Filipe Galvão, o Fiuk. O vídeo não era um ataque pessoal a Fiuk, não possuía uma única linha definindo que Fiuk era isso ou aquilo, o vídeo criticava um comportamento, uma linha de atitude que ele exercia, mas também outros artistas. A crítica era à postura de todos eles e não ao indivíduo.

De lá pra cá, foram quase 5 milhões de visualizações no vídeo e diversas matérias na mídia estabelecendo um grau de inimizade entre nós dois que nunca existiu, mas que as pessoas adotaram como guerra. O público ama briga, o público ama sangue, o público queria que eu e Fiuk fôssemos eternos inimigos. Contudo a vida, como em todo clichê, dá voltas.

O crescimento do canal no Youtube me proporcionou crescer como artista, saindo da internet e me estabelecendo em outros veículos, como o próprio Brasil 247, onde escrevo uma coluna de tempos em tempos. Ganhei um programa no Multishow, fui contratado pela Globo e passei a realizar quadros de humor no Esporte Espetacular, fui contratado para meu primeiro longa-metragem (a ser filmado em breve), comecei a fazer apresentações de improviso teatral junto ao grupo Avacalhados, assinei contratos de publicidade e virei garoto propaganda da Wise Up, entre vários outros trabalhos. E foi aí que uma minoria dos fãs deram uma pirada: “Felipe Neto, você é um vendido”.

Ora, mas é claro que eu sou vendido.

Sou ator há 11 anos, comecei a me interessar pelo assunto e fazer aulas aos 12. Estudei, ralei, fiz peças, suei como todo ator que não possui espaço algum no mercado de trabalho. Tive idas e vindas, desistindo e voltando, mas sempre tentando. Eu não sou (e nunca tive intenção de ser ou aparentar ser) um cara “normal” que um dia ligou a câmera pra falar alguma coisa, como é o caso do meu amigo PC Siqueira. Sempre atuei, comprei a câmera pensando em realizar um trabalho artístico e, no final, acabei tenso sucesso em um projeto amador que as pessoas consideravam como puramente pessoal e sem interpretação. Aliás, sinceramente, não sei como as pessoas puderam gostar de alguém que usava óculos escuros de surfista dentro de casa, falava berrando e só xingava tudo. Só o fato das pessoas terem gostado disso SEM SABER que era uma interpretação já muito me assusta, contudo esse não é o intuito do texto.

O fato de deixar claro que sou ator serve para estabelecer o parâmetro com a expressão “sou vendido”. Amigos… Um padeiro ganha dinheiro vendendo pão. Um advogado ganha dinheiro vendendo conhecimento dentro de uma ação para defender ou acusar. Um médico ganha dinheiro vendendo o auxílio à saúde humana. Um ator, ora porra, ganha dinheiro vendendo sua imagem. Um ator que não é vendido só existe em duas situações: ou ele não atingiu o nível de poder ter a chance de se vender, ou ele é um hippie underground que curte ser diferente. Essa segunda opção, contudo, eu nunca vi.

Vivemos no Brasil. Aqui, a única possibilidade de um ator ter a chance de REALMENTE ganhar dinheiro é fazendo campanha publicitária. Um canal de TV paga um salário de X. Um filme paga um cachê de Y. Uma campanha de publicidade paga X + Y vezes 200. Quando um ator é chamado para ser garoto propaganda de uma marca, ele sai correndo pela rua, cantando na chuva, abraça a mãe, dá um beijo de língua no cachorro de rua e fica pelado na frente da igreja fazendo o pirucóptero. Não? Ok, fui só eu então.

Eu virei garoto propaganda da Wise Up. Contudo, estão lembrados que eu falei que a vida dá voltas? Adivinhem quem foi o outro garoto propaganda contratado para fazer a mesma campanha que eu?

Exatamente. Fiuk. Além do Fábio Porchat e o Rodrigo Santoro, que já era garoto propaganda da empresa.

Quem decide não sou eu. Quem ataca um ator por ele ter aceitado TRABALHO é porque realmente não faz a menor ideia do mundo dos bastidores da classe artística. A população clama por rebeldia, por xingamentos, por postura rock’n roll, mas esquece que Ozzy Ozbourne fez comercial com o Justin Bieber, que o Chorão e o João Gordo fizeram comercial da Coca-Cola, que o David Letterman fez comercial com o Jay Leno (eles se odeiam publicamente até o último fio de cabelo) e que, até hoje, nunca foi relatado um único caso de artista transgressor que dissesse: “não, eu não quero a oportunidade de ganhar dinheiro com meu trabalho e aparecer numa propaganda nacional de grande divulgação. Eu quero é continuar do lado de fora, pobre e esquecido”.

Eu nasci na Internet e, pela Internet ainda ser taxada como “do lado de fora”, muitos esperavam de mim a postura de nunca me estabelecer dentro da mídia. Essa classe, contudo, esqueceu ou não sabia da primeira parte desse texto: meu trabalho é ser ator. A Internet pra mim foi e é meu principal trabalho de exposição, foi o que me lançou, foi o que me estabeleceu. Mas eu nunca (e friso, NUNCA) disse que ficaria do lado de fora, só na internet, criticando todo mundo. Eu tinha e tenho mais a oferecer, tenho sonhos, anseios de um jovem artista que deseja ter casa e família. Nasci pobre, cresci pobre e sempre sonhei com um futuro em que poderia dar conforto para as pessoas ao meu redor. Hoje tenho essa chance graças ao meu trabalho e é mais que óbvio que irei agarrá-la.

Ora, por que vocês exigem de mim um comportamento eternamente do lado de fora da mídia, se nem mesmo os que não são atores, quando têm essa oportunidade, a agarram? Mais uma vez cito o exemplo do meu amigo PC Siqueira. Nunca ator, nunca roteirista, nunca se apresentando em público e que hoje tem programa na TV e assina campanhas publicitárias. Assim como eu, PC toma pedradas de pessoas que não querem ver alguém se dar bem. Na mente dessas pessoas, quem veio da internet por lá deve ficar eternamente e nunca, absolutamente nunca, ganhar dinheiro com isso. Desculpem amigos, mas se a mesma situação fosse apresentada a vocês, nenhum recusaria.

Voltando a Fiuk, finalmente veio o dia em que gravamos nosso comercial juntos, bem como com o Porchat e o Santoro, semana passada. Nos conhecemos e, de cara, ficou nítido para todos ao nosso redor que esse clima de inimigos nunca existiu, nem da minha parte e nem da dele. Somos dois artistas fazendo um trabalho juntos porque fomos contratados pra isso. O quão idiota seria ele dizer: “não quero essa oportunidade, chame apenas o Felipe”, ou eu no mesmo caso? Eu critiquei um comportamento de Fiuk, ele absorveu a crítica, nos encontramos e tudo se estabeleceu em grau de coleguismo. Somos profissionais, não somos pivetes fedendo a leite querendo guerra. Por sinal, uma ressalva vê-se necessária: Fiuk abandonou o comportamento antigo que foi alvo do meu vídeo, cresceu como artista e, em conversa particular, revelou: “se eu tivesse me visto de fora naquela época até eu ia pensar o que você pensou de mim”. Fiuk vem amadurecendo, era um moleque de 19 anos que de repente viu milhões de fãs enlouquecidos gritando seu nome. Hoje, ele vem mudando. Não somos amigos, não vou ligar pra ele quando tiver um problema no meu relacionamento e vice-versa, mas somos colegas de trabalho representando uma mesma empresa, numa sacada genial da Wise Up: pegar o que o público considerava dois inimigos e colocá-los na mesma campanha, gerando comentários e divulgação.

No que depender do meu trabalho, outras campanhas virão, outros trabalhos aparecerão. Aos que dizem que eu me vendi, obrigado, isso é apenas a constatação de um fator óbvio: estou me vendendo, logo, estou dando certo como artista. Chamar um ator de vendido é chamar um dono de padaria de bom comerciante. Não adianta odiar… Se você não gosta mais de mim porque eu cresci, existe uma solução muito simples: volte pra internet e dê uma busca em outros vlogs no Youtube, tem muitos de qualidade que ainda não cresceram. Só cuidado, é capaz de você gostar, divulgar e, por isso, essa pessoa um dia estará numa propaganda na Globo. Se você só gosta do que não faz sucesso, o jeito é só gostar de coisa desconhecida. Boa sorte nisso.

O Não Faz Sentido não amoleceu. Os vídeos diminuiram devido a minha falta de tempo, mas não irei acabar. Recebi pedidos de empresas para que eu pegasse mais leve, que evitasse palavrões, que talvez desistisse do canal. A resposta está no Youtube, meus vídeos mantiveram a mesma pegada, a mesma linguagem e não deixei de fazer nada. Ninguém calou o Não Faz Sentido. E nem irão calar. Existirá, sim, o dia em que o Não Faz Sentido terminará, mas isso só vai acontecer quando EU sentir que não tenho mais tesão de fazê-lo. Até lá, existirão vários Felipes Netos, em vários veículos diferentes, o do Não Faz Sentido será mais um deles.

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